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UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PARANÁ

Metodologia criada na UFPR populariza histórias em quadrinhos na comunidade surda

O Dia Nacional das Histórias em Quadrinhos ou Dia do Quadrinho Nacional é comemorado anualmente em 30 de janeiro. A data tem o objetivo de valorizar, enaltecer e reconhecer as histórias em quadrinhos brasileiras enquanto gênero literário. Na Universidade Federal do Paraná (UFPR), um projeto inovador associa esse tipo de narrativa com inclusão e desenvolve histórias plurilíngues para aprofundar os estudos linguísticos como prática social em contexto de superdiversidade.

Dono de uma metodologia única criada pela professora Kelly Priscilla Lóddo Cezar com a participação do professor surdo Danilo Silva, ambos do curso de licenciatura em Letras Libras, o projeto HQ’s Sinalizadas trabalha com temas transversais dos artefatos da cultura surda como história, língua, cultura e saúde. “O objetivo é criar, aplicar e analisar histórias em quadrinhos sinalizadas como uso de sequências didáticas bilíngues para o ensino de surdos”, explica Kelly.

Alguns dos quadrinhos já publicados pelo projeto

Todas as histórias em quadrinhos produzidas pelo grupo apresentam vídeos sinalizados em Língua Brasileira de Sinais (Libras), desenhos/ilustrações e escrita do português. “Essas linguagens podem ser utilizadas, especialmente, quando a proposta destina-se a contemplar os temas transversais como ética, orientação sexual, meio ambiente, saúde, pluralidade cultural, trabalho e consumo, congregando professores e pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento”, sugere a criadora, observando que pesquisas normalmente priorizam a aplicação da língua de sinais no contexto do ensino e da educação e que, por isso, é tão relevante abordá-las em outras esferas como o projeto já fez, contemplando história, psicologia, saúde mental e esporte. Além dos vídeos sinalizados em Libras, as obras contam com sinalários, isto é, registros em libras dos principais conceitos apresentados nas narrativas visuais.

Professora Kelly em ilustração de Addyson Celestino, seu orientando.

O projeto nasceu quando a professora trabalhava com gêneros textuais e discursivos e o ensino para surdos. Um de seus alunos desenvolveu uma história em quadrinhos como trabalho de conclusão de curso que rendeu apresentações em congressos e publicações em periódicos científicos. “A partir daí, outros pesquisadores e estudantes começaram a me procurar para saber mais a respeito do processo de criação das obras e para seguir a metodologia estabelecida. Assim, resolvemos criar o projeto específico com a temática”, revela Kelly que hoje tem seis orientandos na área, três coorientandos de outras instituições e participações em projetos de pesquisa externos em outras universidades. A iniciativa também tem apoio da Gibiteca de Curitiba e do historiador e pesquisador da Universidade Católica de Lisboa, Paulo Vaz de Carvalho.

As histórias em quadrinhos sinalizadas publicada pelo projeto podem ser acessadas e baixadas gratuitamente pelos links abaixo. Mais HQ’s estão em andamento, aguardando recursos para publicação.

O Congresso de Milão

Essa HQ bilíngue para surdos retrata a opressão sofrida mundialmente pela comunidade surda desde que o “Congresso de Milão” (1880) proibiu as línguas de sinais. Na história, o personagem Marcelo, surdo sinalizante de língua brasileira de sinais (libras), demonstra que a forma de conceber o mundo está nos olhos de quem vê e evidencia a dificuldade de comunicação pela modalidade oral e suas línguas dominantes. Marcelo encontra em um shopping uma colega ouvinte que se comunica em libras. Ela o leva para uma palestra que irá contar sobre esse período de opressão vivido pelos surdos. O personagem Marcelo perpassa as principais épocas históricas até retornar aos tempos atuais. Ao final, ele destaca a importância de se comunicar pela língua de sinais, visto que é por meio dela que a comunidade surda tem o conhecimento em suas mãos.


Tons de Melancolia

A HQ visa abordar, de forma sensível. questões do adoecimento psíquico grave em jovens e adolescentes surdos brasileiros. Embora toda a trama seja sustentada pelo pano de fundo da cidade de Curitiba/PR, tem como premissa alcançar todos os surdos que se enquadrem nos riscos de violência autoprovocada ou de ideação suicida. O material retrata a história de dois adolescentes surdos que residem em Curitiba e compartilham de uma melancolia silenciosa. Ambos se sentem constantemente tristes e angustiados e não conseguem falar sobre o que sentem pela barreira linguística que os permeia até que se deparam com uma profissional – psicóloga – surda que minimiza a barreira linguística e pode fazer uma intervenção segura.


A mulher surda na Segunda Guerra Mundial

Essa HQ bilíngue foi idealizada, roteirizada e criada por Germano Weniger Spelling, surdo e aluno do curso de licenciatura Letras Libras da Universidade Federal do Paraná, tendo por objetivo apresentar a história da mulher surda no contexto da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). A história fala sobre uma mulher surda que, durante a segunda Guerra Mundial, descobre que está grávida e sofre todas as formas de opressão, sendo separada de sua filha depois do parto. Após alguns anos de sofrimento e com o final da Guerra, Sara reencontra sua filha e torna-se professora, repassando seus conhecimentos em língua de sinais. A história é marcante e considerada “pesada”, não há como não se emocionar!


Surdolimpíadas: encontros linguísticos

A narrativa conta a história de dois personagens surdos que se encontram a caminho da surdolimpíada para disputarem a Modalidade Orientação. Ela chama-se Júlia, compete na modalidade Cidade. Ele, Júlio, apelidado de Juju, compete na Mata, ambos personagens foram inspirados em indivíduos reais da comunidade. Durante a competição, as ilustrações perpassam as regras da modalidade Orientação em verde e amarelo. As cores foram propositalmente escolhidas para representar as surdolimpíadas no Brasil. Este material, além de ser bilíngue, pode ser utilizado em várias etapas do conhecimento escolar que sirva de motivação para a criação de outras HQs sinalizadas sobre os artefatos culturais, em especial, as da área do esporte.