Uma equipe de pesquisadores brasileiros embarca nesta sexta-feira (10) rumo à Antártida para realizar expedição de 20 dias. Durante a temporada no extremo sul do continente, os pesquisadores coletarão amostras de água e de sedimentos marinhos que, após analisados, apontarão como esse ambiente antártico vem se modificando com base em alterações ambientais.
O objetivo principal da pesquisa é trabalhar com o ciclo do carbono. Esse elemento químico está presente na composição dos seres humanos, nas células, nos tecidos e em outros organismos, além de estar dissolvido nos oceanos e na atmosfera. Na atmosfera, ele se encontra na forma de gás carbônico (CO2 ) e consiste em uma grande preocupação, pois está diretamente relacionado ao aquecimento global. “O intuito é entender como esse elemento participa das atividades, dos organismos, da produção de matéria orgânica e qual é o papel dele nas mudanças climáticas, que são muito mais expressivas nessa região de estudo”, explica o coordenador do projeto, professor César de Castro Martins, do Centro de Estudos do Mar (CEM) da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
A região da Península Antártica, onde o estudo será desenvolvido, é considerada uma das poucas áreas relativamente preservadas do planeta, constituída de sistemas ecológicos e criosféricos capazes de responder de forma dinâmica a mudanças ambientais ocorridas em escala local e global. “A elevação da temperatura global é sistematicamente sentida nessa região, resultando na diminuição das áreas de gelo marinho, no aumento pronunciado no aporte de material continental e, consequentemente, na alteração da dinâmica do carbono orgânico e dos metais-traço no ambiente marinho local”, destaca Martins que considera a região como o laboratório ideal para observar estas alterações.
Por meio das amostras de água e de sedimentos marinho, que serão coletadas pelos pesquisadores, será possível obter algumas respostas a respeito da modificação do ambiente antártico com base nas alterações ambientais, sejam humanas ou naturais. As alterações ambientais são resultado de um aumento de temperatura que levam a um maior degelo. O pesquisador afirma que o aporte de água doce nesse ambiente altera todo o ciclo de vida de alguns organismos que são fundamentais para captar o carbono que está na coluna d’água ou aquele que está na atmosfera e, então, minimizar os impactos das atividades humanas e do efeito estufa.
Um dos grandes agentes do aquecimento global é o aumento da concentração de gás carbônico na atmosfera. Esse gás carbônico vem dos processos de combustão da queima de biomassa, como desmatamentos, e da queima de combustíveis fósseis provenientes do petróleo. Uma vez que o CO2 vai para a atmosfera, não é absorvido em grande escala pelos organismos terrestres e marinhos, concentrando-se lá e causando o efeito estufa, que ocasiona o aumento de temperatura no planeta. Ao trabalhar com o ciclo do carbono nos organismos presentes na coluna d’água e no sedimento da região antártica, é possível observar como o ambiente responde a esse processo.
“Outra frente de trabalho é analisar contaminantes orgânicos que estão presentes nessa região e que chegam nela por meio do transporte atmosférico vindo dos continentes onde estão estabelecidas as maiores atividades industriais e a maior aglomeração humana”, comenta o coordenador que está na expectativa de que o período da expedição apresente condições climáticas favoráveis para a coleta de um grande número de amostras. “É fundamental para correlacionarmos com as amostras que serão coletadas nas próximas expedições, que acontecem em 2021 e 2022. Com essa série, poderemos responder algumas questões em escala espacial e temporal”.
Para esse verão foi programada apenas uma expedição de uma única equipe. Para o próximo ano, estão planejadas três visitas de três equipes em períodos diferentes: final da primavera, meio do verão e início do outono. Já em 2022, novamente apenas uma equipe deve fazer a coleta de amostras em uma única expedição.
Trajeto e estadia
De acordo com Martins, a preparação para viagem começou em setembro de 2019, quando foram enviados todos os materiais de coleta que serão utilizados durante o próximo mês. Os pesquisadores embarcam nesta sexta-feira (10), no Rio de Janeiro, em um avião da Força Aérea Brasileira. Haverá uma parada técnica da aeronave em Pelotas, Rio Grande do Sul, local em que a equipe também pegará roupas especiais para enfrentar o frio extremo da região. De Pelotas, o grupo parte, no sábado (11), rumo à cidade de Punta Arenas, no Chile. Na cidade, a mais austral do país, os pesquisadores devem permanecer aguardando a reinauguração da estação brasileira de pesquisas antárticas, que acontece no dia 14.
Em seguida, no dia 15, a equipe pega o mesmo avião com destino à base chilena Presidente Eduardo Frei. “Ao chegarmos à Antártida, embarcamos no navio polar Almirante Maximiano, da Marinha do Brasil. Ele será nossa casa pelas duas semanas seguintes, pois utilizaremos toda a infraestrutura da embarcação para realizar a pesquisa”, explica o coordenador.
Apesar de reinaugurada, nessa expedição ainda não será possível utilizar a estação brasileira de pesquisas antárticas pois, durante um período de seis meses serão realizados testes e ajustes com a equipe de construção. Por isso, os pesquisadores devem se hospedar nesse navio, que ficará ancorado na mesma região da estação, a Baía do Almirantado. “Utilizaremos os botes presentes no navio para deslocamentos e coletas em ambiente marinho”, revela Martins.
Projeto
O projeto As múltiplas faces do carbono orgânico e metais no ecossistema subantártico: variabilidade espaço-temporal, conexões com fatores ambientais e a transferência entre compartimentos (CARBMET) foi aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no âmbito da Chamada do Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR) em novembro de 2018.
O CARBMET é desenvolvido por meio de cooperação entre a UFPR, a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e a Universidade Federal de Sergipe (UFS). Para esta expedição, mais dois pesquisadores foram escalados, além do coordenador: Rafael André Lourenço, da USP, e Tatiane Combi, docente da UFBA e egressa da UFPR.