UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PARANÁ

Alunas da Pós em Filosofia conquistam premiações com pesquisas sobre o amor e o conceito de gênio de Diderot

Duas alunas do Programa de Pós-Graduação em Filosofia (Pgfilos) da Federal do Paraná foram as vencedoras da edição 2020 do Prêmio Filósofas de Distinção Acadêmica em Mestrado e Doutorado. O concurso foi promovido pela Rede Brasileira de Mulheres Filósofas e pela Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia do Brasil (Anpof).

A tese “Amor pelo avesso: de Afrodite a Medusa. Estética da existência entre antigos e contemporâneos”, defendida em 2020 por Cassiana Lopes Stephan, caracteriza as relações amorosas na Antiguidade e na Contemporaneidade, com a intenção de apresentar alternativas históricas e políticas para a experiência do amor no tempo presente. A pesquisa foi orientada por André de Macedo Duarte, professor titular do Departamento de Filosofia da UFPR, com coorientação de Inara Zanuzzi, docente da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 

A curitibana decidiu não assistir à premiação. “Pensei que não ganharia, tendo em vista que minha pesquisa é um tanto quanto heterodoxa”. Enquanto se dedicava a um artigo que deveria terminar naquela semana, a surpresa: “De repente, vejo uma ligação perdida do meu orientador. Meu coração disparou”. Após ler a notícia no aplicativo de mensagens, acessou a transmissão no YouTube. “Senti um forte arrepio e uma grande emoção”, recorda Cassiana, que completa 32 anos em 2021.

A dissertação de Kamila Babiuki, intitulada “O debate sobre o gênio no Iluminismo francês: o caso Diderot”, também chamou a atenção da comissão avaliadora. Na sala de casa com o companheiro Rafael e com Margot, integrante felina da família, a ponta-progressense de 27 anos recebeu a notícia. “Estávamos despretensiosamente acompanhando a transmissão, de modo que a surpresa foi bem grande quando ouvi meu nome, sobretudo porque as indicadas vinham de todo o Brasil”. 

O resultado foi divulgado no dia 14 de dezembro. Concorreram trabalhos apresentados entre 2017 e 2020 em Programas de Pós-Graduação em Filosofia do Brasil. Coordenador do Programa e orientador de Kamila, Rodrigo Brandão destaca a originalidade e a qualidade das pesquisas. “O prêmio concedido às alunas foi como um presente ao Programa. É a primeira edição do prêmio, criado por um coletivo que enfrenta o preconceito acadêmico e pretende dar visibilidade à obra de filósofas”.

Estudantes da UFPR desde a graduação, Kamila e Cassiana fizeram parte do PET Filosofia. “Os trabalhos delas concorreram com os de outras mulheres filósofas de todo o país e de programas de pós-graduação de excelência. São trajetórias que encarnam a exitosa simbiose entre a dedicação individual e as políticas públicas de formação e pesquisa”, celebra o docente da UFPR. O Pgfilos completa 20 anos em 2021. 

Bolsista da Capes, Cassiana fez parte do doutorado na França. Kamila, bolsista Erasmus Mundus, participou do programa de Mestrado Tripartite – acordo do Pgfilos com a Universidade de Rennes, na França, e a Universidade de Laval, no Canadá.

Novo olhar para o amor

Cassiana, pós-doutoranda do Pgfilos, premiada pela tese que apresenta alternativas históricas e políticas para a experiência do amor no tempo presente. Foto: Arquivo pessoal

“Estou interessada em pensar de que modo podemos embaralhar as fronteiras entre o amor e a amizade para nos desvencilharmos de vínculos narcísicos, autoritários e tirânicos, os quais atravessam os diferentes níveis e aspectos de nossas vidas”. Com essa afirmação, Cassiana apresenta a proposta de sua tese e convida a diferentes perspectivas acerca do amor. Problematizar e debater sobre os vínculos sociais na esfera pública e também na vida privada é o objetivo do estudo. Na visão da autora, Afrodite e Medusa figuram amores libertários, cuja prática pode remeter a movimentos políticos e culturais e a experiências artísticas, íntimas e literárias. 

Para a doutora em Filosofia, a pesquisa contribui para a reflexão sobre a violência atrelada à normalização ou à normatividade do amor. “Além de diagnosticar as misérias afetivas de nossa atualidade, a pesquisa também propõe alternativas criativas, que nos permitem vislumbrar outras formas de se viver neste mundo, as quais são capazes de transformá-lo na medida em que concebem e afirmam sua multiplicidade”.

A metodologia que adotou pode ser considerada um diferencial em relação a outros estudos sobre a temática, avalia Cassiana. O trabalho articula a filosofia à literatura, ao cinema e à história. Com a proposta de uma tese-ensaio, faz uso de estratégias narrativas literárias. “Através de tais recursos, tento mostrar sob um viés feminista que o pessoal também é político”, explica.

No início da graduação na Federal do Paraná, em 2007, a filósofa foi fisgada pelo tema que norteia a pesquisa: as relações amorosas. Ao conhecer o movimento punk, abriu espaço para os questionamentos que surgiram a respeito das complementaridades e diferenças entre a amizade e o amor. Na vivência do grupo, percebe o que descreve como uma despretensiosa dimensão filosófica. “Este tipo de vida subverte os paradigmas hierárquicos que descrevem e prescrevem como devem ser o amor e a amizade. Os punks nos mostram que para amarmos não precisamos nos sacrificar e nos reduzir a normas repressoras”, argumenta.

O assunto, de certa forma, a acompanha desde a infância. A mãe é lembrada ao ser questionada sobre o que a motivou a aprofundar o assunto. “Minha mãe dizia que o amor familiar não deveria ser uma obrigação, mandatório, mas que deveria ser como o amor que exercemos entre amigos, isto é, franco e espontâneo”, recorda.

Para Cassiana, além da visibilidade acadêmica, a premiação representa uma nova era na Filosofia. “Uma era mais feminina e feminista. O prêmio dá grande e importante visibilidade acadêmico-profissional ao trabalho de mulheres na Filosofia, campo dominado por homens”, pontua.

A aluna da Pós em Filosofia da UFPR recebeu o Prêmio Anpof 2016 de Melhor Dissertação de Mestrado – também defendida no Pgfilos, onde cursa pós-doutorado, com projeto intitulado “Filosofias do amor: sobre a relação entre espiritualidade, melancolia e ambivalência”.

Ao longo da pesquisa de doutorado, enfrentou desafios profissionais e pessoais. Entre os que considera positivos, dois estágios de pesquisa na França e ser escolhida para assumir a primeira bolsa do Centro Michel Foucault (CMF) em parceria com o Instituto da Memória da Edição Contemporânea (Imec). Experiências em ambientes de pesquisa excludentes, no Brasil e no exterior, remetem a adversidades.

Pegadas da genialidade

O conceito de gênio de Diderot, filósofo e escritor francês, foi tema de estudo para Kamila durante o mestrado na UFPR. O trabalho recebeu destaque no Prêmio Mulheres Filósofas 2020. Foto: Arquivo pessoal

O que há em comum entre aqueles considerados gênios foi o questionamento principal da pesquisa de Kamila. A dissertação foi defendida em 2019. “O que faz com que possamos afirmar que ‘Einstein é genial’ e ‘Mozart é genial’ se viveram em períodos distintos, trabalharam em diferentes áreas e tiveram histórias particulares? Será que há uma característica comum entre a pessoa que é genial na pintura e nos esportes, por exemplo?”, indaga a mestre em Filosofia. 

Analisar o modo como o filósofo e escritor francês Denis Diderot mobiliza conceitos para tratar do tema, aliado à contextualização do cenário da França e da Inglaterra do século XVIII, foi a ideia central do estudo. De acordo com Kamila, conforme o trabalhos críticos já existentes, o fio condutor por trás da ideia de gênio teria sido alterado entre 1750 e 1770. O que indicaria uma ruptura conceitual entre os textos desses dois períodos. 

“Essa alteração consistiria em passar de uma definição de genialidade pautada no entusiasmo enquanto característica principal, para uma outra na qual seu elemento central seria a razão, tendo dois conceitos opostos como protagonistas em cada um desses dois momentos”, detalha. Na leitura proposta pela filósofa, há uma alternativa diferente a essa interpretação: não haveria uma ruptura, mas uma evolução. Kamila, que estuda o autor desde a graduação, concentrou a dissertação nos textos de estética de Diderot.

Uma nova perspectiva entre as leituras da filosofia de autores do século XVIII é uma das contribuições do trabalho realizado, avalia doutoranda do Pgfilos, que atualmente estuda a relação do gênio com a ética. Da graduação ao doutorado, a estudante contou com bolsas de incentivo à pesquisa. “Apoio imprescindível e sem o qual seria inviável conceder a mesma dedicação ao trabalho acadêmico”, afirma.

Entre as etapas vencidas e celebradas, relata o processo de seleção para o mestrado Tripartite – com entrevista em francês -, o acesso à bibliografia necessária, o manejo do tempo, encontrar a sua forma de escrever e de pesquisar e administrar a pesquisa e a vida pessoal.

A vencedora da premiação na categoria dissertação de destaque ressalta: uma pesquisa em qualquer nível não é feita sozinha. “Tive grande apoio do Grupo de Estudos das Luzes. Os integrantes são muito abertos para discutir os textos e sempre contribuíram para a pesquisa de maneira muito rica, favorecendo uma discussão capaz de ajudar a superar todos aqueles desafios que vêm com um projeto de pesquisa”.

De acordo com Kamila, conhecer culturas de outros países e universidades a fez valorizar ainda mais a qualidade da Federal do Paraná. “Estar em outro país me fez olhar com novos olhos para o meu próprio e, consequentemente, perceber a riqueza das pesquisas em filosofia na UFPR”.

Pgfilos

De acordo com a coordenação, até fevereiro de 2021, 286 alunos concluíram os cursos de mestrado e doutorado – criados na UFPR em 2001 e 2012, respectivamente. O quadro docente 2020/2021 é formado por 27 professores.

Proporcionar formação acadêmica aprofundada, capacitar os alunos para a pesquisa e o mercado de trabalho ao nível universitário – por meio da discussão filosófica dos temas e problemas teóricos – são objetivos do Pgfilos. Metafísica e Epistemologia, Ética e Filosofia Política e História da Filosofia são as linhas de pesquisa.

Rede Brasileira de Mulheres Filósofas

A página da Rede Brasileira de Mulheres Filósofas reúne dados, notícias, sugestões de eventos relacionados e um acervo de trabalhos brasileiros. 

O coletivo de profissionais engajados em projetos sobre mulheres e filosofia promove discussões sobre questões de feminismo e gênero e desenvolve ações para ampliar a visibilidade das obras de filósofas, com vistas a combater o preconceito acadêmico.

Sugestões

Capa abre segundo edital para tradução e revisão de textos acadêmicos
O Centro de Assessoria de Publicação Acadêmica (Capa) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) está com...
Inscrições para Pré-Vestibular Comunitário da UFPR seguem até segunda (25)
O Pré-Vestibular Comunitário (Prevec 2024) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) oferta 50 vagas para...
Prevec está com edital aberto para seleção de colaboradores voluntários
O Pré-Vestibular Comunitário (Prevec), do setor Palotina da Universidade Federal do Paraná (UFPR), está...
Olimpíada Paranaense de Matemática recebe inscrições de escolas até 10 de maio
Estão abertas as inscrições para a primeira fase da edição 2024 da Olimpíada Paranaense de Matemática...