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Professora de Harvard mostra como queda de recursos afeta saúde pública no país; UFPR terá curso em parceria em 2019

O retorno de doenças que estavam eliminadas, o aumento da mortalidade infantil e da desnutrição, assim como a sobrecarga financeira para os municípios, são alguns dos problemas resultantes dos sucessivos cortes de recursos da União para o sistema de saúde brasileiro, segundo a professora e pesquisadora Marcia Castro, da T. H. Chan School of Public Health da Universidade de Harvard. Em painel organizado pelo Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD), Marcia apresentou na UFPR, nesta quinta-feira (19) à noite, um panorama dos desafios e perspectivas para a saúde do país.

Apesar de assinalar alguns pontos altos, como a resposta rápida do País às recentes epidemias de zica, dengue e chicungunha, Marcia avalia que o quadro já se mostra de “retrocesso profundo”.

De acordo com a pesquisadora, que tem formação em Estatística, o país corre o risco de retornar a índices de saúde pública anteriores aos da criação da cobertura universal pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que ocorreu com a Constituição de 1988. “Vamos perder décadas de ganhos e levar décadas para voltar ao que tínhamos”, acredita. “[Alguns desses indicadores] deveriam fazer parte apenas da história da saúde pública no Brasil”.

Marcia Castro, da Escola de Saúde Pública de Harvard, e o professor Adriano Massuda, do Departamento de Saúde Coletiva da UFPR. Imagens: Reprodução UFPR-TV

No caso das doenças infecciosas, Márcia destaca as dificuldades no combate à dengue e à leishmaniose visceral, bem como o ressurgimento da sífilis e da sífilis congênita. A taxa de incidência da sífilis em bebês passou de cinco a cada mil por nascimentos, em 2003, para quase 20 em 2015.

Quanto à sífilis, a pesquisadora destaca que existe um descompasso de diagnósticos: a taxa de detecção da doença em recém-nascidos é maior do que nas mães, o que mostra uma lacuna não só na deteção em adultos, mas nos pré-natais. “Existe uma falha dramática na triagem em tentar detectar a doença antes que ela afete o bebê”, observou Marcia. Segundo dados de 2016, em capitais como como Teresina, Fortaleza, Recife e Porto Alegre, o índice de diagnósticos em bebês é superior ao de gestantes e muito superior à média brasileira.

Outra estatística que mostra retrocessos é o da mortalidade infantil. A mortalidade de crianças de até um ano subiu pela primeira vez em 26 anos em 2016 e, segundo o Ministério da Saúde, a tendência é que a taxa de 2017 mostre mais crescimento. De acordo com Márcia, a epidemia de zica teve efeitos sobre esse dado, mas a falta de recursos para a saúde é a principal explicação. “Voltamos a ter crianças morrendo de diarreia, que era uma notícia comum nos anos 80”, disse.

A mesa do painel, formada por Marcia, Adriano Massuda (Departamento de Saúde Coletiva da UFPR); Paulo Opuszka; e Vera Karam, da Faculdade de Direito da UFPR

O recuo da cobertura vacinal, que era um dos aspectos em que o Brasil se destacava no mundo, também gera dados preocupantes. O país chegou a ter uma das maiores taxas de cobertura do mundo — chegava a mais de 95%. Dados recentes apontam que um a cada 4 municípios tem cobertura abaixo do ideal nas vacinas obrigatórias para bebês e crianças. A queda na vacinação tem impacto em doenças que se consideravam eliminadas, como o sarampo e a pólio. “Quanto ao sarampo, já houve mortes de crianças em aldeias ianomâmis”.

Desigualdade

Para Marcia, atualmente o Brasil enfrenta a “carga tripla de doenças”, o que significa desafios a serem vencidos entre as doenças infecciosas, as crônicas e a violência — que também onera e prejudica o funcionamento do sistema de saúde. “O modelo brasileiro é o que chamamos de modelo de transição prolongado e polarizado. Ou seja, demora a responder a estímulos e gera desigualdade”, afirmou.

A pesquisadora salientou que município pequenos são os que mais são atingidos com a sobrecarga financeira gerada pela ausência da União. Como registrou Marcia, municípios muito pequenos podem sair da cobertura total do SUS para zero cobertura com a ausência de uma única equipe de profissionais de saúde. “A desigualdade é muito grande”, comentou. “Quem acaba sofrendo com a piora dos indicadores é quem já tem os piores indicadores”.

Por conta disso, a pesquisadora avalia que medidas de austeridade — em especial a Emenda Constitucional 95/2016, a PEC do Teto — têm consequências “desastrosas”. “Quando uma norma determina o congelamento de gastos, geralmente é na parte social que se corta”, analisou.

Nesse contexto, Marcia avalia que o papel dos cientistas é o de denunciar tendências e “reacender a luz no fim do túnel”. “Omitir-se não é opção”.

Parceria

A presença de Marcia Castro na UFPR também tem relação com parcerias acadêmicas que a universidade firmará com a Escola de Saúde Pública de Harvard. Uma delas é o curso de especialização em saúde global, que deve ter edital lançado em setembro, com início de aulas em 2019.

A ideia é que 15 alunos de pós-graduação da UFPR e 15 de Harvard sejam selecionados no edital, que prevê a mobilidade internacional entre os países. “O Brasil tem uma experiência muito rica em seu sistema de saúde, que deve ser pesquisada”, afirmou Adriano Massuda, professor do Departamento de Saúde Coletiva da UFPR e pesquisador-visitante na Harvard T.H. Chan School of Public Health.

Acesse a apresentação (slides) da professora Marcia Castro

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