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80 anos de SCH: conheça atrações da Semana Comemorativa e depoimentos de quem marcou o Humanas

Hoje com dez departamentos, o Setor de Ciências Humanas (SCH) da UFPR começou como faculdade paranaense, em 1938. É a fundação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FLCL) — federalizada em 1950 — que rendeu o aniversário de 80 anos que o setor comemora ao longo de uma semana em Curitiba, com abertura nesta segunda-feira (26) à noite (veja a programação aqui). A programação conta com mesas redondas e palestras que abordam o histórico do SCH, além de conferências e até um festival gastronômico no Pátio da Reitoria, na quinta (1.º/3).

A passagem dos 80 anos do SCH será a oportunidade de o setor inaugurar uma honraria aprovada em abril passado, em nível setorial: o Prêmio Mérito Humanidades. A intenção da iniciativa é que o SCH destaque pessoas que atuaram pela valorização das Ciências Humanas em âmbitos científico, acadêmico, artístico e político. Nesta edição inicial, serão 11 homenageados.

Indicados pelos departamentos por meio de dossiês, os nomes foram selecionados por uma comissão julgadora. De acordo com a diretora do SCH, professora Ligia Negri, ainda serão apreciadas pelo conselho setorial ideias como a periodicidade da homenagem, que pode se tornar bianual. A entrega dos prêmios será a partir das 19 horas de quarta (28) no Círculo de Estudos Bandeirantes (R. XV de Novembro, 1.050, Centro).

O Humanas em dois momentos: ainda Faculdade de Filosofia, Ciências em Letras, no fim dos anos 50; e já setor com dez departamentos, em 2017. Fotos: Biblioteca IBGE e Samira Chami Neves/Sucom-UFPR, 2/2/2017

Na mesma ocasião, serão homenageados sete servidores aposentados, também indicados pelos departamentos, que receberão o Humanidades dentro de uma categoria específica para esta edição: a Gratidão (veja a lista completa de homenageados ao fim da matéria).

Prêmio

Os nomes da primeira edição do Mérito Humanidades ajudam a traçar um panorama da história recente do Humanas. Alguns deles começaram no SCH como alunos da graduação. É o caso dos historiadores Ana Maria Burmester e Sérgio Odilon Nadalin, dos escritores Cristovão Tezza e Caetano Waldrigues Galindo, do antropólogo José Guilherme Cantor Magnani, da professora e pesquisadora de Literatura Marilene Weinhardt e do turismólogo Miguel Bahl. Todos são professores e pesquisadores — alguns na ativa, outros não.

Assim, essa fatia do grupo reúne impressões de quem foi universitário no Humanas em décadas diferentes — dos anos 60 aos 90. Independentemente do ano, muitos destacam a sensação de ingressar em uma universidade em tempos em que o acesso ao ensino superior era mais restrito.

“Vinda do interior, de União da Vitória, lembro das emoções de estudar em universidade na capital”, conta Ana Maria, que se formou em História em 1968. “Esta emoção continuou nas primeiras experiências de pesquisa nos livros da Catedral, início muito bom na atividade acadêmica”.

Marilene Weinhardt, que se graduou em 1973, entrou no Humanas pela primeira vez em dezembro de 1969, para frequentar o cursinho preparatório para o vestibular oferecido pelo Centro Acadêmico de Letras. Os professores eram seus veteranos e os espaços seriam os mesmos que frequentaria como aluna e depois como docente.

“Evidentemente, aos 17 anos eu não teria vislumbrado esse então futuro nem como possível, quanto mais como tão duradouro”, lembra. “Até porque, embora já então tivesse certeza de que queria ser professora de literatura, não julgava que teria qualquer chance de fazer carreira nesta instituição, vista como um Olimpo, em época em que o acesso ao quadro docente de uma universidade pública era, digamos, nebuloso”, diz ela, referindo-se aos anos anteriores às regras para concursos públicos.

Rito de passagem

José Guilherme Magnani faz alusão a uma expressão da Antropologia (“rito de passagem”) para descrever sua entrada na universidade. Vindo de São Mateus do Sul, no Sudeste do Paraná, Magnani é filho de pai marceneiro e mãe professora primária. “A primeira impressão foi de estranhamento diante do primeiro prédio, onde funcionava a Filosofia”, conta. “A sensação foi de rito de passagem porque não deixou de significar minha entrada em uma instituição com prédios monumentais, ao lado da Reitoria”.

Magnani teve o curso de Ciências Sociais interrompido em 1970, quando partiu para o exílio forçado por conta da sua participação política em movimentos anti-ditadura — quase unanimidade entre os universitários da UFPR da época. No Chile e na Argentina, desenvolveu suas pesquisas até se firmar na Antropologia Urbana, que leciona na Universidade de São Paulo (USP). Para ele, estudar no Humanas significou a abertura de um “horizonte grande”, visto que a graduação lhe reservou uma formação genérica na área. “Mais tarde é [que ocorre] o contato com o mundão”, analisa.

Cristóvão Tezza, Carlos Alberto Faraco, Ana Maria Burmester e José Guilherme Magnani. Fotos: Guilherme Pupo/Divulgação; Karina Sabbag/Sucom-UFPR, 15/3/2013; Jonas Oliveira/AENoticias, 4/5/2011; e Maria Leonor de Calasans/IEA-USP

Miguel Bahl formou-se em duas graduações no Humanas: do antigo curso de Estudos Sociais, em 1980, e no de Turismo, em 1983. Isso porque, na época, uma opção para os alunos de Estudos Sociais era a chamada “licenciatura curta”: interessados na docência tinham a oportunidade de engrenar outra graduação. Em 2018, o curso de Turismo completa 40 anos de existência, tempo que Bahl acompanhou quase integralmente. “Construiu minha carreira dentro do Humanas”, define.

Entre os graduados no Humanas que serão homenageados, Cristovão Tezza é o único que não leciona mais. Antes disso, porém, foram 25 anos passados no interior do Humanas, entre a graduação e a atuação como professor. “As marcas daquele tempo ficaram”, conta. Assim Tezza se refere aos amigos que ainda encontra e “às condições de sobrevivência como escritor”, além do que define como “consolidação de formação acadêmica”, que permaneceram dos tempos no SCH.

Tezza ingressou no curso de Letras em 1978, aos 26 anos, já com ideia de viver da literatura um dia. “Tinha um projeto de escritor na cabeça e a ideia de me tornar professor para sobreviver”, conta ele, que avalia, no fim das contas, ter encontrado no Humanas mais do que um modo de sustento.

“A virada dos anos 70 para os 80 foi um período de profundas transformações sociais, políticas e culturais no Brasil, com a ditadura militar se encaminhando para o fim, a forte urbanização do país e o fortalecimento das universidades”, recorda-se.​ “Na área de Ciências Humanas, os estudos literários e linguísticos davam um salto de qualidade, modernizando-se rapidamente. Como estudante, entrei em contato com o que havia de estudo ‘de ponta’, por assim dizer, nessas áreas. E isso me direcionou para o trabalho acadêmico que eu iria desenvolver mais tarde, já como professor, no mestrado e no doutorado”.

Construção

No grupo de professores e ex-professores homenageados há ainda os que sempre desempenharam o papel de docente no Humanas. Formado em Letras em 1972, o linguista Carlos Alberto Faraco entrou no SCH pela primeira vez em 1974, quando fez o chamado exame de habilitação para a função de auxiliar de ensino de Linguística e Língua Portuguesa. Faraco tem na memória a banca que o avaliou até hoje. Foram três professores: Rosário Farani Mansur Guérios, criador do curso de Letras, em 1939; Eurico Back, responsável pela consolidação do ensino de Linguística no curso; e Miguel Wouk, então chefe do Departamento de Linguística, Letras Clássicas e Vernáculas.

“No convívio com estes professores, minha primeira impressão foi muito positiva e desafiadora”, lembra-se. “Todos eram muito dedicados ao ensino e à pesquisa e profundamente comprometidos com a universidade. Davam, para nós da nova geração, as balizas que deveríamos seguir”.

Faraco foi um dos principais linguistas a difundir a vertente de Mikhail Bakhtin no Brasil — muitos estudos foram feitos à quatro mãos com Cristovão Tezza. Apesar de o autor russo representar um reposicionamento de conceitos tradicionais da Linguística, Faraco conta que a abordagem não enfrentou problemas de aceitação entre pesquisadores mais antigos. “Nosso programa de pós-graduação foi sempre muito receptivo a diferentes perspectivas teóricas”, acredita. “Fui um dos divulgadores do pensamento do Círculo de Bakhtin no Brasil e na UFPR orientei alguns trabalhos de pós-graduação vinculados ao pensamento bakhtiniano”.

Caetano Galindo; Egidio Romanelli; Marilene Weinhardt; e Miguel Bahl. Fotos: Reprodução; Acervo Familiar; Reprodução UFPR-TV; e Acervo Pessoal

Isso não significa, porém, que a década de 70 foi um período de calmaria no Humanas. Além da efervescência política, o setor ainda estava se adaptando às diretrizes da Reforma Universitária promovida pela ditadura militar, em 1968, que marcou o fim da FLCL e impulsionou uma primeira renovação no quadro de professores.

“Passei muitas e muitas horas diárias no [Edifício] Pedro I, dando aulas, atendendo os alunos, convivendo com colegas professores. Foi muito marcante o convívio com os professores mais antigos, que inspiravam a nova geração a estar sempre comprometida com o ensino e a pesquisa e com a universidade como instituição pública”, afirma Faraco. “A minha geração, por outro lado, esteve envolvida com as movimentações políticas, dentro e fora da universidade, que marcaram o fim do regime militar. Nesse sentido, estar na UFPR nas décadas de 1970 e 1980 foi também uma oportunidade muito especial de aprendizado e prática política”.

Docência

Os que ingressaram no Humanas como professores — alguns, bastante jovens — observam como a evolução da prática da docência esteve (ou está) atrelada às rotinas do setor.

Aos 80 anos, Egidio Romanelli lembra-se de quando começou a dar aulas no Departamento de Filosofia, em 1974. Já pesquisador experiente, com doutorado na Université Toulouse III na área de neuropsicologia, impressionou-se com o “engajamento” dos alunos do Humanas, tanto nas aulas quanto na política. Romanelli participou da criação do Departamento de Psicologia e lecionou também no Mestrado em Educação, isso a partir dos anos 90. Aposentou-se na UFPR em 2003, mas continua professor em universidades e cursos pelo Brasil.

Isso porque, para Romanelli, lecionar é um prazer. “O magistério, para mim, é engrandecimento pessoal. Possibilita que eu participe da vida dos alunos, os acompanhando e o seu desenvolvimento acadêmico”, descreve. No que se refere ao Humanas, ele avalia que todas as turmas e orientandos deram sua contribuição para que se encontrasse na docência. “Foi onde eu encontrei ninho, um local onde pude me desenvolver tudo, pesquisa, magistério e extensão. Foram 30 anos acompanhando alunos da graduação ao doutorado, todos em sequência”, conta.

OS HOMENAGEADOS (e o departamento que os indicou)

Mérito Humanidades

Ana Maria Burmester (Departamento de História);
Caetano Waldrigues Galindo (Departamento de Literatura e Linguística);
Carlos Alberto Faraco ( Departamento de Literatura e Linguística );
Cristovão Tezza (Departamento de Literatura e Linguística);
Egídio José Romanelli (Departamento de Psicologia);
José Borges Neto (Departamento de Literatura e Linguística)
José Guilherme Cantor Magnani (Departamento de Antropologia);
José Luiz da Veiga Mercer (Departamento de Literatura e Linguística);
Marilene Weinhardt (Departamento de Literatura e Linguística);
Miguel Bahl (Departamento de Turismo); e
Sérgio Odilon Nadalin (Departamento de História)

Mérito Humanidades (categoria Gratidão)

Ana Christina Bittencourt (Departamento de Ciência Política);
Ana Maria Cristofolini (Direção do SCH);
Cleonice Fritoli (Departamento de Turismo);
Irene Camilo (Departamento de Turismo);
Lorena Celi Saviski (Departamento de Psicologia);
Nair Nardi Lago (Departamento de Letras Estrangeiras Modernas); e
Sérgio Bajerski (Departamento de História)